Problemas de saúde mental durante a infância são mais comuns do que imaginamos. Cerca de 6% a 17% das crianças e adolescentes são afetados por transtorno de ansiedade ou depressão. Estudos identificaram que muitas crianças e adolescentes com transtorno de ansiedade apresentavam distorções cognitivas, que são caracterizadas por padrões de pensamentos negativos, ou seja: quando a repetição de conteúdo depreciativo e negativo impactam negativamente nos pensamentos, emoções e comportamento, afetando seu bem-estar, na forma como enxerga o mundo e no funcionamento adaptativo.
De acordo com o artigo Cognitive errors and anxiety in school aged children, as distorções cognitivas são o resultado do padrão de pensamentos negativos. Quando essa negatividade na forma de pensar se torna um padrão já na infância, elas orientam como as informações e os eventos são interpretados ao longo da vida da pessoa.
Pensamentos negativos são comuns e todo mundo tem, crianças ou adultos. Mas é preciso ter cuidado para que isso não se torne recorrente a ponto de virar algo comum e se transformar em padrões, ainda mais durante a infância.
Se você perceber que seu filho tem muitas distorções cognitivas – se seus pensamentos são rígidos, suas expectativas são negativas de forma crônica, ou seus sentimentos são muito fortes para que consigam refletir sobre seus padrões de pensamento, é hora de procurar ajuda de especialistas. Uma criança que esteja sofrendo por causa disso, de forma que sua rotina, comportamento e forma de ver o mundo são afetados, precisa de acompanhamento de um profissional.
O que é: Ver as coisas de apenas duas maneiras, categorias ou possibilidades, fazendo pensar que são boas ou ruim, branco ou preto, sem os tons de cinza. Uma distorção comum que faz você pensar – e então sentir – que se alguma coisa não é tudo o que você quer, então não é nada do que você quer. Também é pensar que você precisa performar muito bem em tudo – perfeccionismo – ou você falhou totalmente.
Na prática: Eu não passei na minha primeira opção de universidade, então minhas esperanças são totalmente frustradas. Ou se eu não tirar 10 na prova, eu falhei completamente.
O que é: Acreditar que, porque você sente algo, deve ser verdade, mesmo quando não há outra evidência além do sentimento.
Na prática: Me sinto sozinho, então ninguém gosta de mim. Ou tenho medo de elevador, e por isso os elevadores são perigosos.
O que é: Falar sobre um detalhe ou evento negativo em relação a uma situação e torná-lo um padrão universal tomando como verdade sobre toda a sua vida.
Na prática: Tal pessoa não quer sair comigo. Ninguém nunca quer sair comigo! Ou eu estraguei o meu experimento de química hoje. Eu nunca faço nada certo!
O que é: COlocar um rótulo negativo em si mesmo – ou nos outros – para que você não veja mais a pessoa por trás do rótulo. Quando você fecha a pessoa num pensamento assim, seu entendimento se torna tão rígido que não há mais espaço para você ver a si mesmo ou a outra pessoa de maneira diferente.
Na prática: Eu caí hoje no futebol, tentando marcar um gol. Eu sou muito desastrado! Ou eu não tinha nada a dizer nessa conversa. Eu sou muito desinteressante!
O que é: Prever que algo vai acontecer de uma forma negativa. Isso pode se tornar numa forma pessimista de ver o futuro e pode impactar no comportamento, aumentando a probabilidade da sua previsão negativa acontecer.
Na prática: Eu sei que vou muito mal nessa prova (e então você fica nervoso e sua performance cai). Ou Se eu falar com essa pessoa, ela não vai falar comigo ou me aceitar (e então eu não falo com ela e tenho a chance de me conectar com alguém que eu quero para conhecer melhor ou me ajudar).
O que é: Assumir que você sabe e entende o que outras pessoas estão pensando e, geralmente, ter certeza de que isso reflete mal em você.
Na prática: Eu estou falando com outra pessoa, e ela parece não estar prestando atenção. Tenho certeza de que ela não gosta de mim. (E na verdade você não sabe o que a pessoa está pensando: ela pode só estar distraída, ou estar preocupada com outra coisa não relacionada com você e está com dificuldade em se concentrar, por exemplo).
O que é: Pegar um problema ou algo negativo e colocar fora de proporção.
Na prática: Essa festa vai ser a pior experiência de todas!
O que é: Tomar algo positivo que aconteceu e minimizar para que “não conte” como uma coisa boa na experiência ou na sua vida. Desconta qualquer evidência contra a nossa visão negativa de nós mesmos ou de uma situação.
Na prática: Eu fui bem no teste, mas foi pura sorte. Ou uma pessoa falou “eu amo sair com você!”, mas ela só está sendo simpática, ela não quis dizer isso.
O que é: Ver apenas o negativo ao invés de olhar para o positivo ou para todo o aspecto da experiência.
Na prática: Você escreve um artigo para o professor e ele te dá vários feedbacks positivos, mas você escreveu o nome de alguém errado. Tudo o que você consegue pensar é no nome errado. Ou você tem várias conversas positivas no dia, e numa delas você falou algo constrangedor. Você só foca na coisa constrangedora que você falou com total horror, esquecendo todas as outras interações legais que teve.
O que é: Fazer com que tudo seja sobre você quando não é. Isso inclui culpar você mesmo por algo além do seu controle e levar coisas para o pessoal quando não pretendem ser prejudiciais para você.
Na prática: Se eu não desse tanto trabalho para meus pais, talvez eles não estariam se divorciando. Ou como aquela pessoa ousa andar na minha frente, isso é tão desrespeitoso! (Quando a pessoa só não viu você e te cortar foi apenas uma distração)
O que é: Pensar em “dever” e “ter que” (e o inverso, “não dever” e “não ter que”).
Na prática: Eu deveria fazer apresentar os trabalhos na aula sem me sentir ansioso. O que há de errado comigo? (Claro, pensando assim, no auge do nervosismo, te deixa ainda mais nervoso em relação a apresentação!)
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Fazer terapia pode ajudar! A terapia cognitivo-comportamental ajuda a identificar, desafiar e reestruturar esses pensamentos.
Para ações além da terapia, é importante começar observando você mesmo, identificando e reconhecendo os seus padrões pensamentos negativos. Por exemplo, se seu filho tem ansiedade, você pode acabar personalizando isso, se culpabilizando e se rotulado como um “péssimo pai/mãe”. Sempre lembrando de que é uma distorção cognitiva, que é reversível e sem tantos julgamentos, tanto em relação a si mesmo quanto (e principalmente) em relação à criança.
Para ajudar as crianças a aprenderem sobre as distorções cognitivas, você pode explicar com cartões divertidos ou um jogo de perguntas e respostas. É importante manter esse trabalho de equipe de forma leve e sem cobrar tanto, e tomar cuidado para não invalidar as crianças e dizer o que elas estão sentindo – mesmo que sem querer – ou dizer que esses pensamentos negativos são “errados” ou “ilógicos”. Mesmo que sejam, não podemos assumir que as crianças estão prontas para lidar e ver dessa forma. Cada pessoa tem seu tempo, inclusive e principalmente as crianças.
Lembrando que se você perceber que seu filho está com pensamentos muito rígidos, cobra muito de si mesmo e suas expectativas são quase sempre negativas, procure um pediatra, terapeuta, psicólogo ou psiquiatra.
Referências:
Freitas Pereira, Barros, Mendonça “Cognitive errors and anxiety in school aged children”
Auto-estima é o quanto as pessoas se valorizam e o quão importante elas acreditam que são para elas mesmas e no mundo. Uma auto-estima positiva é quando as pessoas se sentem bem consigo mesmas. E nas crianças, como funciona a auto-estima? Por que é tão importante? Aprenda mais sobre auto-estima e como ajudar seu filho a construí-la.
Todas as crianças são capazes, mas as que têm alta auto-estima se sentem e se percebem confiantes e capazes, valorizam suas habilidades e a elas mesmas. Se orgulham das coisas que podem fazer e querem dar o seu melhor.
Quando crianças se sentem confiantes e seguras sobre quem são, é mais provável que tenham uma mentalidade sempre em crescimento. Isso significa que elas podem se motivar a enfrentar novos desafios, lidar e aprender com os erros, se defender e pedir ajuda quando precisam, com mais facilidade.
Crianças desenvolvem auto-estima trabalhando com um objetivo e ver o seu trabalho ser reconhecido. Alcançar objetivos comprova para elas mesmas que têm o que é preciso para enfrentar novos desafios. Seu sucesso faz com que se sintam bem com elas mesmas, e aprendem que não há problema em falhar. Quando as crianças se saem bem em alguma coisa e o que fazem é reconhecido por pessoas próximas que elas gostam, também se sentem bem. Como tempo, elas continuam a construir uma boa auto-estima.
Muitas crianças têm problemas em construir ou manter uma auto-estima elevada por muitas razões. Uma razão muito comum é quando a criança tem problemas na escola.
Se a criança falha na escola, seja repetindo de ano ou tirando notas baixas, provavelmente não recebe muitos comentários positivos e reconhecimento dos professores ou colegas de classe. Geralmente, o feedback que recebem é negativo, já que constantemente ouvem sobre o que não fizeram bem, ou que não foi suficiente.
Em alguns casos, as crianças podem receber feedbacks positivos que não são sinceros. Isso pode fazer com que não confiem nos adultos que supostamente as ajudam, ou a desconfiar de outras crianças que seriam suas amigas.
Como resultado, elas têm menos certeza de si mesmas e de suas habilidades. Elas se sentem menos motivadas a tentar coisas difíceis e podem ter dificuldade em lidar com erros e problemas. No fundo, elas podem não acreditar que são dignas de sucesso ou de algo bom.
Construir uma boa auto-estima é possível. Crianças podem aprender e melhorar a maneira como se veem e se valorizam. Para isso, ter pais ou responsáveis realistas — mas não super protetores — é fundamental. Pedir aos professores que sejam realistas e solidários também é importante.
É importante elogiar seus filhos de maneiras que desenvolvam a auto-estima e guiá-los para que reconheçam e se orgulhem de seus esforços e realizações. Elogie os esforços das crianças, e não tudo o que elas fazem. Crianças sabem quando o que fizeram ou bem-sucedido e quando não foi. Quando seus filhos terminam uma tarefa, pergunte:
A amizade é uma parte importante na construção de uma auto-estima elevada. Isso não significa que seus filhos precisam ter milhares de amigos ou ser popular. Ter um amigo que aceite seu filho ou filha por quem ele/ela é, já faz toda a diferença. Ajude seus filhos a descobrirem o que eles gostam de fazer, e a desenvolver as habilidades relacionadas.
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Elogiar crianças (de forma genuína) é importante, mas é ainda mais significativo que crianças aprendam a reconhecer e apreciar seus próprios feitos. O que você diz e como diz pode ajudar as crianças a reconhecer coisas das quais dão orgulho para elas mesmas. Aqui estão algumas sugestões:
O projeto que você está analisando é bom, mas sabe que a criança poderia ter se esforçado mais.
Tente dizer: “Esse é um bom começo.” ou “Como você gostaria que ele ficasse?”
A conexão de auto-elogio: Essa abordagem ajuda a criança a refletir se o seu trabalho está de acordo com as suas expectativas. Isso também pede que considerem o quanto eles trabalharam e se estão orgulhosos do esforço que fazem.
Seu filho/a fez algo bem, mas está subestimando sucesso do seu esforço.
Tente dizer: “Você pode achar que não é grande coisa, mas foi gentil da sua parte defender seu amigo” ou “Parece que você está orgulhoso! O que mais faz você se sentir assim?”
A conexão de auto-elogio: Essa abordagem aponta o que você acha que merece elogios e o que você valoriza. Também pede às crianças que pensem sobre o que têm orgulho e o que valorizam.
Você sabe que seu filho/a trabalhou duro, mas não atingiu a meta estipulada.
Tente dizer: “Lamento que você não tenha atingido seu objetivo. Você chegou perto! Você acha que consegue da próxima vez? O que acha de pedir ajuda se sentir necessidade?” ou “É bom que tenha gostado dos livros que leu, mesmo que a leitura possa ser difícil para você.”
A conexão de auto-elogio: Essa abordagem pede às crianças que reflitam sobre o que funcionou, e não apenas sobre o que precisa ser aprimorado. Também ajuda as crianças a aprenderem a fazerem o que gostam, mas não são ótimas.
Seu filho/a gabaritou numa prova – e sabe disso.
Tente dizer: “Eu adoraria saber como você conseguiu! Quais estratégias você usou?” ou “Posso ver que você está animado/a! Você trabalhou muito”.
A conexão de auto-elogio: Essa abordagem lembra as crianças que fazer algo de forma consciente exige algum esforço, mesmo que não duvidassem que poderiam fazê-lo. Essa abordagem pede às crianças que percebam que o que fizeram levou ao sucesso, e ajuda a reconhecer e se orgulhar do resultado.
Créditos: Understood